quinta-feira, 28 de maio de 2020

PORTA PARA O INFINITO, de Carlos Castañeda - Comentários por Francisco Souto Neto.


LIVROS COM HISTÓRIAS QUE NÃO ESTÃO NOS LIVROS – Um livro pode conter muito mais do que aquilo que vem escrito no seu conteúdo. O exemplar pode ter histórias pessoais do seu dono, ou conter dedicatórias raras, ou ter sido emprestado e ter ali registradas impressões manuscritas dos leitores, por ter sido impresso há cem ou duzentos anos... e assim por diante. Este blog pretende, pois, contar algumas dessas histórias paralelas a determinados exemplares da minha biblioteca.

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Capa de PORTA PARA O INFINITO, de Carlos Castañeda.

 Comendador Francisco Souto Neto

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PORTA PARA O INFINITO, de Carlos Castañeda

Comentário por Francisco Souto Neto

Castañeda.

Ganhei este livro de minha prima Terezinha Macedo, de Campo Grande, MS. Pelo meu lado materno, ela é a prima mais especial por ser com quem sempre tive mais afinidade, do mesmo modo que, pelo lado paterno, minha prima mais especial é Lúcia Helena Souto Martini – atualmente reside em Paulínia, SP – que é minha coautora na biografia de nosso trisavô o Visconde de Souto.

Terezinha com sua filha Cláudia em Veneza. Foto atual (2019).

A dedicatória de Terezinha em Porta para o Infinito é datada de 1980. Até então eu nunca tinha lido o peruano Carlos César Salvador Arana Castañeda (1925-1998), embora soubesse de quem se tratava. Lembrava-me de que seus livros eram apresentados como autobiográficos. 

Dedicatória de Terezinha para mim, em 13.10.1980.

A crítica em jornais e revistas da época eram-lhe sempre favoráveis, embora a revista Time tenha feito uma reportagem a seu respeito, declarando que muito do que ele dizia ser, não correspondia à verdade.

Capa da revista TIME de 5 de março de 1973.

De fato, o personagem principal, Don Juan Matus, apresentado como verdadeiro, nunca existiu, segundo vários estudos e pesquisas posteriores à morte de Castañeda. Entretanto, basta citarmos o mais contemporâneo Juan José Benítez, com sua saga Cavalo de Tróia, para considerarmos que a literatura e a imaginação podem ser mais fortes do que a realidade, e que apresentar uma ficção literária como verdadeira, pode ser simplesmente um jogo publicitário. É lícito desde que não prejudique ninguém, algo muito diferente das modernas “fake news” que fazem enojar o jogo político. “Fake news”, isto é, notícias falsas usadas politicamente para ajudar a eleger um presidente, é imoral e é crime, tal como vimos ocorrer nas eleições de 2018; criar fantasias literárias é uma questão de criatividade, de imaginação e de talento, pois obras mal escritas via de regra não vendem milhões.

Eu e Terezinha em 1980, na minha sala da biblioteca, na ocasião em que dela ganhei Porta para o Infinito.

Eu e Terezinha num foto em preto e branco, de 1980, artisticamente colorizada com proposital exagero.

Mais ou menos na mesma época eu estava muito interessado em Aldous Huxley, e tinha lido alguns de seus livros (que serão meu próximo assunto aqui neste blog), dentre os quais As Portas da Percepção e O Céu e o Inferno, justamente quando se soube pela imprensa que Carlos Castañeda revelou em livro suas experiências com um alucinógeno, a mescalina. Paralelamente esse escritor também explorava em suas publicações o poder dos alucinógenos. Na ocasião em que esteve no Brasil durante a ditadura militar, ele foi procurado pela polícia e seus livros proibidos pelo Governo Federal de entrar no nosso país, por se acreditar que incentivavam os jovens do movimento hippie ao uso de drogas.

Aproximadamente dez anos antes, eu já vinha me interessando pelo realismo fantástico na literatura, desde que havia lido uma obra que estava na lista das mais importantes de então: O Despertar dos Mágicos, de Louis Pauwels e Jacques Bergier. 

Porta para o Infinito me pareceu uma admirável, mas ficcional, iniciação aos mistérios da feitiçaria. Talvez fosse melhor dizer “o prosseguimento de uma admirável iniciação”, porque seus livros anteriores a este que estou comentando é que deram início às referências ao personagem Don Juan. Entretanto, a interessante introdução a Castañeda me foi proporcionada pela Terezinha há já muito tempo: exatos quarenta anos. Eu tinha apenas 35 de idade.

Segundo registros, Castañeda havia lido o livro de Aldous Huxley As Portas da Percepção, em que celebrava os efeitos psicotrópicos da mescalina, que era usada de forma ritual por vários povos indígenas americanos. Castañeda chegou a escrever um pequeno ensaio sobre esse livro de Huxley. O escritor peruano, então, pesquisou o tema das plantas medicinais em vários livros e partiu para o trabalho de campo no sudoeste da Califórnia.

Aos poucos, Castañeda foi sendo posto ao encontro de experiências cognitivas que desafiavam o poder de lógica de sua razão. A Erva do Diabo, seu primeiro livro, também tese de mestrado, em seu princípio, era considerada uma obra de cunho científico.

Eu li este livro há mais ou menos uns 40 anos, já não me recordo dos detalhes, mas lembro-me de tê-lo julgado curioso e instigante, uma interessante lembrança da minha prima Terezinha Macedo.

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4 comentários:

  1. Tanto a literatura, quanto a imaginação, tem demonstrado muitas vezes maior força que a realidade e um grau de previsibilidade incrível, além das consequências, influências ou ondas que, por vezes, chegam às praias da história - como está demonstrado por todas as invenções sugeridas primeiro em certos filmes, livros ou imagens, que depois passaram a existir no mundo real.

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    1. Caro Carlos Oswaldo Bevilacqua, você está certo, pois isso realmente vem ocorrendo, e até com bastante frequência. Há poucos dias assisti ao filme Laranja Mecânica, uma das obras-primas de Kubrick, lançado em 1971. Praticamente há meio século. A história se passa num futuro meio caótico. Numa das cenas, numa residência, aparece um televidor pendurado na parede, com tela retangular, tal como os que temos hoje em nossas casas. Naquele tempo, um televisor assim seria algo inconcebível...

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    2. Francisco Souto Neto, eis outro site interessante: https://jotacortizo.wordpress.com/category/julio-verne/

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    3. Caro Bevilacqua, interessantíssimo, pelo que vi por enquanto apenas superficialmente.
      Ficará aqui guardado, até ao momento mais adequado em que poderei me dedicar à leitura extensa e profunda. Obrigado... e um abração.

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