LIVROS COM HISTÓRIAS
QUE NÃO ESTÃO NOS LIVROS – Um livro pode conter muito mais do
que aquilo que vem escrito no seu conteúdo. O exemplar pode ter histórias
pessoais do seu dono, ou conter dedicatórias raras, ou ter sido emprestado e
ter ali registradas impressões manuscritas dos leitores, por ter sido impresso
há cem ou duzentos anos... e assim por diante. Este blog pretende, pois, contar
algumas dessas histórias paralelas a determinados exemplares da minha
biblioteca.
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Alguns Aldous
Huxley da minha coleção.
Comendador Francisco Souto Neto
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ADMIRÁVEL MUNDO NOVO, AS PORTAS DA PERCEPÇÃO, O
CÉU E O INFERNO, O MACACO E A ESSÊNCIA, A ILHA... e outros, de Aldous
Huxley
Comentário por Francisco Souto Neto
Aldous Huxley.
Quando eu residia em Ponta
Grossa, viajava muito a São Paulo para visitar meus parentes e para assistir a
peça teatrais ou ao lançamento de filmes, num tempo, lá pelas décadas de 60 e
70, em que filmes não eram lançados simultaneamente no país, e que após a
exibição em São Paulo e Rio, poderiam levar um ano ou mais para chegarem às
telas dos cinemas ponta-grossenses.
Quando eu estava a passeio
em São Paulo, ia invariavelmente à Livraria Francesa, que ficava na Rua Sete de
Abril, e a outras das imediações.
O livro Admirável Mundo Novo acompanhou-me na longa viagem
A inauguração da Rua
Engenheiro Francisco Souto Júnior, meu avô, ocorreu na cidade de São Pedro,
interior paulista, na véspera do Natal. Viajei então a São Paulo, donde parti
com meus parentes em direção a Piracicaba, e de lá para São Pedro. Mas ao chegar
a São Paulo, creio que no dia 23 de dezembro, eu fui à Livraria Francesa e a outras nas imediações, quando encontrei o livro Admirável Mundo Novo,
que há muito eu desejava conhecer. Levei esse exemplar comigo ao longo de todo
o percurso planejado até São Pedro, para ir lendo nos hotéis onde me hospedei e
também no meu retorno a Ponta Grossa.
Admirável Mundo Novo.
Minha anotação na abertura do livro.
Minha anotação ao término da leitura.
A quarta capa (ou contracapa) do livro.
Na inauguração da rua em homenagem a meu avô em São Pedro, SP
Antes de referir-me a Admirável Mundo Novo e aos demais livros
de Aldous Huxley, todos com histórias paralelas, vou anexar, abaixo, algumas
fotografias do percurso que fiz carregando este livro: São Paulo – Piracicaba –
São Pedro – Piracicaba – São Paulo – Ponta Grossa:
Na manhã de 22 de dezembro de 1967, em São Paulo, com minha avó Mãe
Nina e Tia Jurema, prestes a iniciarmos a viagem a Piracicaba.
Dia 23 de dezembro. Na casa de meu Tio Jurandir em Piracicaba, em
frente a um dos gigantescos viveiros de pássaros que ele criava por puro
prazer. Era possível passear dentro dos viveiros. Na foto: eu, Tio Oscar, Tia
Iracema, Mãe Nina, Tio Jurandir.
Na casa de meu Tio Jurandir em Piracicaba, com minha avó Mãe Nina,
em frente a um dos enormes viveiros.
Dia 24 de dezembro. Já na cidade de São Pedro, meus parentes
caminhando para o local da inauguração.
Minhas tias Cecy e Iraty.
Minhas familiares chegando ao local da inauguração.
Meu Tio Jurandir discursando na inauguração da Rua Engenheiro
Francisco Souto Júnior.
A placa com o nome da rua, em fotografia desfocada.
Vamos iniciar o retorno a Piracicaba: Tia Lourdes, Mãe Nina, eu, Tia
Iracema e Tia Jurema. Observar que a placa do carro de meu Tio Jurandir tinha
apenas quatro dígitos: 32 14. Sem letras e sem mais números.
Retornando a Piracacaba, Tia Jacy, eu e Tia Jurema paramos nos
parques de Águas de São Pedro.
Em Piracicaba, Tia Jurema e eu nas Quedas do Rio Piracicaba.
Em Piracicaba, minha tia Cecy, “faraônica” na rede, enquanto minha
prima toca violão e canta na casa de Tio Jurandir.
Natal em Piracicaba. Minha Tia Jurema vai ao piano, na casa de Tio
Jurandir, e toca músicas natalinas.
Dia 26 de dezembro, em São Paulo, minha avó Mãe Nina com seu poodle
Joy no quintal de sua casa.
Na parede da casa de minha avó, o retrato (óleo sobre tela) de Francisco Souto Júnior.
Enquanto me hospedei em hotéis durante a viagem, bem como
quando viajava com meus parentes ou ainda, depois, no percurso de retorno em
ônibus entre São Paulo e Ponta Grossa, eu lia Admirável Mundo Novo.
Nos primeiros dias de janeiro em Ponta Grossa, meu amigo
Gilson Cordeiro fez uma sensível publicação no Jornal da Manhã, a respeito da
inauguração da rua em homenagem à memória do meu avô.
Texto de Gilson Cordeiro no Jornal da Manhã. Janeiro de 1968.
Meus outros livros de Aldous Huxley
Quatro dos cinco livros de Huxley que tenho em minha biblioteca.
Outros livros de Aldous
Huxley, da minha biblioteca, têm também algumas histórias paralelas. Por
exemplo, O Macaco e a Essência, que
eu li mais ou menos há meio século, por volta do começo da década de 70. Era um
livro de que gostei muito. Durante o curso de Direito, uma colega, a Evelyn, me
pediu o exemplar emprestado. Emprestei-o, mas ela nunca o devolveu. Minha
solução, para não ficar pedindo o livro de volta, foi simples: dirigi-me à
Livraria Montes, onde comprei outro exemplar novo, que mantenho até hoje.
Belíssimo foi o livro que
ganhei de minha amiga Marlene Sant’Anna em 1975: A Ilha. Assim, fui lendo e me
deliciando em multiplicar meu conhecimento das obras-primas de Huxley.
Capa de A Ilha de Aldous Huxley.
Dedicatória de Marléne para mim.
Minha anotação ao terminar a leitura em 4 de dezembro de 1975.
Outro livro memorável de
Huxley foi As Portas da Percepção e O Céu e o Inferno. Neste, Aldous Huxley
conta suas experiências com um alucinógeno chamado mescalina. Eu li este livro
apenas uma vez, e isto aconteceu há muito tempo, uns 55 ou 60 anos passados, portanto
já não me recordo dos detalhes.
Capa de As Portas da Percepção
e O Céu e o Inferno.
Coincidentemente, logo após
ter lido esse livro, recebi a visita de um primo de São Paulo, que viajou a
passeio a Ponta Grossa na companhia de um seu amigo, que era um jovem ator que
já tinha até feito uma ponta num filme com Joana Fomm. Minha mãe encontrava-se
em viagem para visitar parentes. Conversando com meu primo e seu amigo, casualmente
veio à baila o assunto de Huxley e os alucinógenos. Contei-lhes que eu tinha a
curiosidade para fazer uma experimentação com alguma droga “leve”, mas com o
sério propósito de que a pesquisa transcorresse tão “cientificamente” quanto possível, e também para
formação de opinião. Estabeleci a condição de que o experimento teria que ser
gravado. “Como ter opinião própria sobre algo que não conheço?”, era a
justificativa. Meu primo e o ator contaram-me que possuíam familiaridade com
marijuana e que poderiam participar para me orientarem na experiência. Isso foi
antes da descoberta do VHS, quando poucas pessoas tinham o privilégio de
gravador em casa. Eu possuía um, que pertencera a meu pai. Um amigo de Ponta
Grossa em quem eu confiava, encarregou-se de conseguir a cannabis sativa para pormos em prática aquela espécie de
desobediência civil. E assim aconteceu. Como faz muito tempo, praticamente há
meio século, já não me recordo de detalhes, porém senti-me como se estivesse
viajando num mundo paralelo, cheio de fantasias de ordem estética e sensorial.
Por exemplo, era como se num movimento dos braços eu pudesse abarcar uma
galáxia... e nesse movimento dos braços, as dimensões se alteravam, deixando
rastros etéreos que transcorriam como nos fotogramas de um filme
cinematográfico. Ou seja, a droga agia sobre o cérebro criando um mundo
artificial mas de extraordinária beleza. Tudo me parecia em transmudação, mas
eu tinha consciência de que aquele “mundo paralelo” era irreal, consequência da
droga.
Enfim, foi uma experiência
válida e cheguei a uma conclusão: a de que a beleza do mundo, pelo menos para
mim, não poderia ser artificial. Que a beleza da vida deveria ser encontrada no
mundo real e a felicidade conquistada no factível e não nos sonhos enevoados e
fantasiosos dos alucinógenos. E isto foi definitivo. A fita magnética da
gravação, passei às mãos de um dos três participantes, pedindo-lhe que a guardasse até que um dia, se sentisse curiosidade, eu a ouviria. Essa fita
ainda existe com o amigo, mas nunca senti nem a mínima curiosidade para
ouvi-la.
Anos depois, fiquei chocado
ao tomar conhecimento de uma declaração da viúva de Huxley. Contou ela ao mundo que quando o marido estava em seu leito de morte, em agonia, ela
aplicou-lhe uma injeção de LSD (ácido lisérgico). Não imagino o que o escritor
possa ter sentido no momento do seu passamento e não tenho opinião formada sobre esse
episódio da Srª Huxley. Mas continuo achando que minha experiência foi
positiva, porque minha decisão após a relatada investida, ocorreu no sentido de
que se tratou de uma experiência válida, porém única e definitiva. E nunca mais
me interessei, nem minimamente, por outras experiências extrassensoriais.
Entretanto, não fiquei
inteiramente livre dos vícios. Por exemplo, não resisto a uma boa fatia dum
bolo, ainda mais se o recheio for de morango com nata. Ou a um chocolate, de preferência da Kopenhague...
Huxley e sua esposa Laura.
-o-
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