LIVROS COM HISTÓRIAS QUE NÃO ESTÃO NOS LIVROS – Um livro pode
conter muito mais do que aquilo que vem escrito no seu conteúdo. O exemplar
pode ter histórias pessoais do seu dono, ou conter dedicatórias raras, ou ter
sido emprestado e ter ali registradas impressões manuscritas dos leitores, por
ter sido impresso há cem ou duzentos anos... e assim por diante. Este blog
pretende, pois, contar algumas dessas histórias paralelas a determinados
exemplares da minha biblioteca.
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Capa de SCLIAR na Galeria de Arte André
Comendador Francisco Souto Neto
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SCLIAR na Galeria de
Arte André
Carlos Scliar
“Descobri” Carlos Scliar (1920-2001) em 1970, ocasião em que eu estava
em férias no Rio de Janeiro, quando ocorria uma grande retrospectiva do pintor
no Museu de Arte Moderna. Há meio século, muito antes da invenção da internet,
os meios de comunicação eram precários. Eu já ouvira dizer que se tratava de um
importante artista plástico, talvez tivesse visto algum trabalho seu estampado
nas revistas O Cruzeiro, Manchete ou Fatos & Fotos, com paisagens ou
natureza morta, mas nada sabia sobre a extensão obra do pintor.
No MAM do Rio vi que a retrospectiva incluía pinturas de retratos de
crianças e adolescentes feitas no começo da carreira de Scliar, e esses
retratos impressionaram-me profundamente. Era como se ele houvesse captado a
alma de seus retratados naquela fase de inocência e pureza.
Depois de ter apreciado a exposição em sua totalidade, tive vontade de adquirir
algum trabalho de Scliar, que já utilizava a técnica de vinil encerado sobre
tela. Graças às marchands de tableaux Ida e Anita, que me deram seu endereço, com
ele mantive uma amizade epistolar durante anos. Bem a propósito, foi na galeria
daquelas senhoras que, no ano de 1981 – há quase 40 anos – comprei uma linda
tela do artista.
Carlos Scliar – Vinil encerado sobre tela – 1981.
Coleção Francisco Souto Neto.
Scliar me enviava cartões natalinos pintados por ele mesmo. Tais cartões eram verdadeiras
obras de arte assinadas e com dedicatória, que recebi do artista desde os
anos 80 até meados da década de 90. Diversos
deles eu coloquei em molduras, outros guardei com minhas coleções de cartões de
Natal que eu e minha mãe recebíamos, às centenas, de amigos.
Cartão de Natal (este de 1983) enviado por Carlos
Scliar para Francisco Souto Neto.
No Natal de 1983, em vez de me enviar apenas um desenho como fazia
habitualmente, mandou-me também um catálogo de sua exposição na Galeria André,
em São Paulo. Um catálogo com aspecto de livro, de grandes dimensões (22 x
26cm), que não cabe no scanner para
reproduzi-lo neste blog. Por isso,
fotografei-o para aqui exibir algumas das suas páginas. Em papel couché, ele está em minha biblioteca
porque é um verdadeiro livro de arte.
Naquela exposição da Galeria André, Scliar mostrou as gravuras ao lado
das pinturas que lhe deram origem. No livro, de maneira muito didática, exibiu
as serigrafias (às vezes com o planejamento para a aplicação de cores e tons) e
as pinturas em vinil encerado sobre tela.
Eu gostaria de rever alguma das pinturas de adolescentes feitas por
Scliar lá pela década de 40 ou 50, mas não encontrei nas pesquisas de Google, nenhum
daqueles retratos feitos por ele. Devem estar bem guardados em coleções
particulares, infelizmente não compartilhados na internet. Mas no livro, isto
é, no catálogo que dele recebi em 1983, há um desenho de um jovem, datado de
1943, que reproduzirei abaixo, ao lado de pinturas e gravuras.
Capa do catálogo (ou do livro, como o considero).
Na abertura do livro-catálogo, a dedicatória de Scliar para F. Souto Neto.
Em 1983, Scliar escreve sobre a sua arte.
À esquerda, um estudo sobre as cores e tons a serem executados nas duas técnicas vistas na página à direita. Acima, o vinil encerado sobre tela, uma obra única. Abaixo, a serigrafia com o mesmo motivo da tela, sobre papel, numerada em geral de 1 a 100.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Exemplos de pintura e serigrafia.
Um dos retratos de jovens em desenho (1943).
Em setembro de 1996, quando Scliar fez uma exposição na Casa de Pedra, como
é popularmente conhecida a Simões de Assis Galeria de Arte, em Curitiba, ali estive para ver seus trabalhos recentes e, que surpresa, lá se encontrava
Scliar sentado, conversando com Waldir, proprietário da galeria, e amigos.
A Casa de Pedra (Simões de Assis Galeria de Arte)
fotografada do alto por Francisco Souto Neto em julho de 2020, localizada à Alameda Dom Pedro II nº 155, esquina com a Alameda Presidente Taunay.
Foi a oportunidade que tive para sentar-me e conversar longamente com o
artista. Lembrei-lhe da sua retrospectiva no MAM do Rio de Janeiro em 1970, que
tanto me impressionara, e conversamos sobre as suas diversas – e cronológicas –
fases na pintura. Na época eu as sabia de memória, porém hoje já não me recordo
com precisão. Contou-me ele que deixou de enviar cartões de Natal com desenhos
originais para os amigos mais especiais, porque esse trabalho tornara-se
demasiado extenso e cansativo, e então resolveu, nos últimos anos, expedir aos
amigos cartões natalinos impressos. Scliar era jovial, simples, agradável. Ele
estava com 64 anos.
Comemora-se o centenário de Carlos Scliar neste ano de 2020. É incrível
pensar que o amigo estaria com cem anos. Como tudo passa depressa, como fluem
as vidas e se extinguem num átimo de tempo! Tudo é fugaz, mais ainda neste
estranho ano em que uma pandemia permeia o planeta ceifando milhares de vidas
diariamente. Que pena que sejamos todos tão efêmeros. Só a arte é perene.
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Em 1996, quando Scliar realizou a exposição na Galeria de Arte Simões de
Assis em Curitiba, escrevi um artigo e publiquei em minha coluna em jornal.
Quem se interessar em ver ou ler, basta clicar o seguinte link:
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