LIVROS COM HISTÓRIAS QUE NÃO ESTÃO NOS LIVROS – Um livro pode conter muito mais do que aquilo que vem escrito no seu conteúdo. O exemplar pode ter histórias pessoais do seu dono, ou conter dedicatórias raras, ou ter sido emprestado e ter ali registradas impressões manuscritas dos leitores, por ter sido impresso há cem ou duzentos anos... e assim por diante. Este blog pretende, pois, contar algumas dessas histórias paralelas a determinados exemplares da minha biblioteca.
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EDUCADORES
PONTA-GROSSENSES, de Joselfredo Cercal de Oliveira
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EDUCADORES PONTA-GROSSENSES, Joselfredo Cercal de
Oliveira
Este livro tem um significado muito pessoal para mim, por dois motivos: primeiro, por ter sido escrito por Joselfredo Cercal de Oliveira, que foi meu professor de Geografia durante três dos quatro anos de ginásio – e ele foi um dos meus três mestres prediletos daquele período de ensino – e pelo conteúdo: ele se refere às escolas da época, desenvolve traços biográficos, com fotografias, dos educadores que atuaram em Ponta Grossa entre 1850 e 1950, e abrange vários que foram meus professores nos cursos primário e ginasial.
Comprei este livro num sebo e contei isto a meu amigo do Facebook, Mário
Cézar Oliveira, filho do saudoso professor Joselfredo. Ele disse-me que seu pai
estava trabalhando numa nova obra que se referiria aos educadores de Ponta
Grossa desde 1950 até ao final do século XX. Uma pena que esse trabalho não
chegou a se completar, pois nele seriam abordados os demais meus professores
que não se enquadraram àqueles reunidos no seu primeiro livro.
Os bons e as más
Eu disse, acima, que Joselfredo Cercal de Oliveira foi um dos meus três professores prediletos nos quatro anos de meu curso ginasial. Devo, portanto, complementar que os outros dois foram Egdar Zanoni, de Português, e Paschoal Salles Rosa, de Francês. Após eu concluir o ginásio e fazer os três anos do então chamado Curso Científico, na época conhecido também como “curso médio”, o professor Paschoal foi mais uma vez meu professor, desta feita de Espanhol. De Português, no Científico, passou a ser a professora Glaci Sêcco, que foi igualmente uma grande mestra.
Nesse universo de mestres maravilhosos, dos quais guardo as melhores lembranças, eu tive duas professoras que me aterrorizaram. A primeira no 1º ano do curso primário, justamente uma alfabetizadora, chamada Dona Maria Antônia. Tudo o que eu me recordava dela era a aparência física e o ato que me traumatizou. Ela era grisalha e devia ter os cabelos muito compridos, porque toda essa cabeleira era reduzida a uma única trança que, da nuca, subia até ao alto da cabeça onde era – a trança – disposta em círculos, um sobre o outro, formando como se fosse uma vistosa coroa arredondada, mais ou menos como a coroa de espinhos de Cristo que víamos em ilustrações e no livrinho de catecismo. Para minha surpresa, encontrei no livro do professor Joselfredo uma fotografia dessa professora quando jovem... sem a “coroa” sobre a cabeça, mas com o mesmo semblante que ficou “impresso” em minha memória. Seu lado assustador comentarei mais adiante.
A outra educadora que me aterrorizou foi Dona Adelaide, professora de Matemática durante os quatro anos do curso ginasial. Ela não consta do livro que estou a comentar, e certamente estaria na obra inacabada do professor Joselfredo. Esta agredia fisicamente os alunos. Se algum de nós, chamado ao quadro-negro para resolver algum problema matemático, errasse, levava um “croque”, ou “cascudo”. Isto nunca me ocorreu, felizmente. Mas o pior é que se o aluno cometesse um erro muito grande, ela pegava o livro de chamada, que era de capa dura e de grandes dimensões, e descia-o com violência na cabeça do menino. Isso também nunca me ocorreu, e para que de fato não ocorresse, eu estudava matemática furiosamente. Um dos meus colegas que ela mais perseguiu, chamava-se Calixto, que era um bom menino, um bom colega. Cada colega que recebia uma chapuletada na cabeça, me abalava, talvez por uma questão de empatia. Eu, que nunca apanhei de meus pais, sentir-me sob a ameaça da agressão era algo estressante. E a professora não queria que contássemos nos dedos. Eu escondia as mãos para trás, pois só sabia contar assim. Ao terminar os quatro anos de ginásio, comemorando estar livre dessa professora perversa, tratei de me esquecer das equações matemáticas para sempre e até hoje, prazerosamente, conto nos dedos.
Esses episódios nefastos na minha infância e que seriam estapafúrdios e inaceitáveis na atualidade, foram comentados pelo jornalista Aroldo Murá no seu livro VOZES DO PARANÁ Volume 9, página 153, onde ele desenvolveu os meus traços biográficos num belíssimo trabalho que muito me sensibilizou. O autor mencionou que tal professora fazia uso de palmatória, mas creio que ele fê-lo numa forma de sintetizar a tortura dos “croques” e dos golpes na cabeça com o livro de chamada. Quem realmente fazia uso de palmatória era outra professora, Dona Armida, mas esta situação tratarei mais à frente.
O livro VOZES DO PARANÁ: https://soutoneto.blogspot.com/2020/04/vozes-do-parana-retratos-de-paranaenses.html
O fato é que vivíamos um tempo completamente diferente do dia a dia atual. Praticamente todos os meus amiguinhos apanhavam dos pais e parece-me que para os outros, de um modo geral, não havia nada de estranho que professores tivessem liberdade de agredir impunemente as crianças. Eu tive a sorte de ter pais maravilhosos. E por isso os professores da minha infância, quando bons e tolerantes, ficaram registrados na minha memória ao mesmo nível de meus pais como exemplos positivos, e foram eles Joselfredo Cercal de Oliveira, Egdar Zanoni e Paschoal Salles Rosa, dentre outros.
Devo acrescentar que minha professora do 2º ano primário, Dona Ida, foi
muito diferente da anterior, porque
era doce e gentil. No 3º ano, em 1953, quando residimos na cidade de Campo
Grande onde meu pai foi fundar um jornal a convite do primo de minha mãe,
Wilson Barbosa Martins (que foi prefeito, governador do Estado e senador da
República), minha professora era uma linda jovem chamada Agnes, e creio que foi
a minha primeira paixão, aos meus 8 anos. Os anos de 1954 e 1955, nós os passamos
em Presidente Venceslau, interior de São Paulo, minha cidade natal, onde cursei
o 4º e 5º anos do curso primário. Meu professor chamava-se Armando de Oliveira
Campos, que era deficiente visual. Completamente cego, era considerado,
meritoriamente, o melhor professor da cidade. Ele era auxiliado por uma
secretária, Dona Zilda. Através dele, descobri que um professor podia ser
extremamente humano. Uma prima que foi minha colega de escola, Helita Barbosa
Serejo, escreveu o livro Pedaços na minha
vida, no qual conta episódios muito bonitos e curiosos das suas lembranças
das aulas daquele professor extraordinário do curso primário.
A fotografia do professor Armando é a única que tenho do curso primário. Descobrir outras fotos no livro do professor Joselfredo foi, para mim, um interessante reencontro com meu passado, e a possibilidade de recordar os rostos dos mestres, rostos estes que começavam a ficar esmaecidos nas brumas nas minhas lembranças mais antigas.
Devo acrescentar que após os cursos primário (de quatro anos) e secundário (às vezes quatro, às vezes cinco anos), vinha o científico (ou o clássico, ou o normal), com duração de três anos. Daí prestava-se um vestibular para entrar na Universidade.
No curso científico tive bons professores. Minha professora predileta
foi Maria da Graça (Grací) Aguiar Armellini, que depois de enviuvar e em
segundas núpcias, passou a assinar Maria da Graça Trény. Dona Grací foi não
apenas minha maravilhosa professora de Literatura Francesa, mas principalmente
uma das pessoas mais importantes da minha vida.
No curso de Direito, só grandes professores. O único que tive a grande
alegria de receber em minha casa, 40 anos após ter me formado, foi o Dr. Antônio
Joaquim Dantas, de Direito Constitucional.
Alguns dos professores
no livro de Joselfredo Cercal de Oliveira.
Dr. Faris, como o chamávamos, um dos intelectuais mais importantes na
História de Ponta Grossa, não foi meu professor. Falava quase dez idiomas. Amigo e colega de
meu pai, escrevia para o Jornal do Paraná, do qual meu pai era diretor de
redação entre as décadas de 40 e 50. Após a morte de meu pai, Dr. Faris
chamou-me para eu ingressar em duas instituições culturais das quais meu pai
participava: o Centro Cultural Euclides da Cunha e a União dos Trovadores do
Brasil seção Ponta Grossa. Em ambas, ainda adolescente, participei das
diretorias.
Fui aluno
do professor Aristeu durante dois ou três anos (não me recordo muito bem desse
detalhe), de História Geral. No primeiro ano do ginásio, após viver dois anos
em Presidente Venceslau (SP) com minha família, cheguei a Ponta Grossa bem
“afinado” com o sotaque paulista que, a bem da verdade, mantenho inconscientemente até hoje. Após
responder à chamada em sala de aula, o professor Aristeu perguntou-me: “Você
aí, você, qual é mesmo o seu nome?”. Respondi-lhe. E ele me falou ipsis literis: “Então, Francisco, vou
ridicularizá-lo. Na chamada, você repondeu ‘presenti’.
Pois agora repita: leite quente”. Com
meu sotaque paulista, disse-lhe: “leiti
quenti”. E ele me perguntou o seguinte: se eu trocava a letra e pela i, por quê não falava então “liiti
quinti”? Eu, naquele março de 1956, estava com apenas 12 anos. Fiquei
calado sem saber o que responder. Nos momentos seguintes, fiquei pensando que
deveria dizer-lhe que ele precisaria “corrigir” não só a mim, mas a todo o
Estado de São Paulo. Desenvolvi antipatia por ele. Entretanto, o professor
Aristeu era ótimo com sua didática, e eu aprendia e estudava História com
prazer. Certo dia, durante sua aula, sem mais nem menos ele começou a falar
sobre um filho. A história pessoal que ele contava foi tornando-se dramática.
Ele contou, já chorando muito, que o seu filho tinha ido nadar num rio,
contrariando sua ordem para que não fosse, e morreu afogado. Para todos nós foi
um grande choque. Ele repetiu várias vezes que não teve culpa no episódio. A
partir daí, senti grande compaixão e empatia por ele, pois nunca tinha visto um
homem adulto chorar, e a partir daquele momento a minha implicância pelo mesmo
desapareceu completamente. Passei a gostar do professor Aristeu para sempre.
Como disse antes, Egdar Zanoni foi um dos meus professores prediletos. Ensinava tão apaixonadamente o Português, com tamanho entusiasmo, que passei a ter com ele as notas mais altas dentre todas as demais matérias, empatando apenas com Geografia e Francês. A certa altura, lá pelo 2º ou 3º ano do ginásio (1957 ou 1958), ele disse-nos que uma vez ao mês nós não teríamos uma simples aula, e sim, uma “reunião literária”. “Vocês precisam não ter medo ou vergonha de falar em público, na frente de outras pessoas”. E nas reuniões literárias cada um de nós poderia falar o que desejasse: ou contar uma história, ou declamar uma poesia, o que quisesse. Disse-nos: “Vocês precisam derrubar a Bastilha”, e contou-nos o que foi a Bastilha em Paris. Então eu decorei “O Navio Negreiro”, em excertos, de Castro Alves. Foi um sucesso. Não me lembro a que altura, talvez lá pela década de 90, morando há muito tempo em Curitiba, descobri o telefone do professor Zanoni em Ponta Grossa e fiz a ligação. A pessoa que atendeu, uma senhora, disse-me que ele estava “muito idoso”, mas que eu poderia falar com ele. Atendeu-me ao telefone, e eu disse-lhe o quanto ele foi importante na minha formação, e que as conquistas que tive em minha vida, estiveram sempre ligadas ao meu domínio da Língua Portuguesa, no que sempre fui estimulado pelos meus pais e por ele. Certamente o professor Zanoni já não se lembrava de mim, mas riu várias vezes, com uma evidente alegria. Pouco tempo depois, consternado, eu soube do seu falecimento.
O professor Coimbra está aqui neste livro relacionado à minha infância e adolescência, porém ele foi meu professor no curso de Direito. Sua cátedra era em Direito Romano. Foi apelidado pelos alunos, carinhosamente, de “Navio na Tempestade”, isto porque ele falava com enorme entusiasmo, andando rapidamente entre as carteiras, levantando os braços, bradando sobre o Direito Romano. Falava com grande fluência, como se estivesse narrando um filme interessante e movimentado. Claro, apaixonei-me pelo Direito Romano. Lembro-me quando ele contou como era a Rocha Tarpeia, de cujo alto eram empurrados os criminosos condenados à morte. Numa das vezes em que estive em Roma, fiz questão de ir ver onde fica esse lugar, sempre me lembrando das entusiásticas aulas do professor Coimbra, que era tio de minha saudosa amiga Marléne Santana Granville Urban.
Eis aqui Dona Maria Antônia, minha professora do 1º ano primário, em 1951. Fez-me pegar o lápis com correção para escrever as primeiras letras: a, e, i, o, u. Depois de alguns meses, ao chegar à sala de aula encontrei, num buraco que existia na parte central mais alta da carteira, um tinteiro. E no lugar do lápis, havia uma pena. Pena era o nome dado a uma caneta de madeira, em cuja ponta existia uma espécie de agulha alargada de metal. Ao lado, um papel mata-borrão. Pela primeira vez, deixando de lado o lápis, mergulhei a pena naquele líquido negro e escrevi com tinta. Parece-me que somente no ano seguinte, já bem treinado com a pena, ganhei uma caneta-tinteiro do meu pai. Caneta esferográfica ainda não existia. Essa professora, tão paciente no começo, um dia me traumatizou enquanto andava entre as carteiras dando a sua aula, e é claro que nem remotamente eu, com 7 anos, me recordo de qual seria o tema. Mas o que então se passou, ficou na minha memória como um filme de terror a que eu tivesse assistido ontem: com aquela trança grossa de cabelo grisalho enrolada no alto da cabeça à guisa de coroa de Cristo, ao passar por uma garotinha que escrevia, ela a agarrou pelos cabelos com as duas mãos, ergueu a menina puxando-a pelas madeixas, sacudiu-a no espaço com faz um crocodilo com uma presa na boca, e atirou-a longe, que caiu entre duas outras carteiras que saíram do lugar, quase derrubando as crianças que as ocupavam. A menina não chorou e sentou-se de cabeça baixa na sua carteira. Parecia ter ficado em estado de choque. Eu me senti como se tivesse uma pedra de gelo no estômago, absolutamente apavorado e tão escandalizado com o que vi, que não tive coragem de contar depois esse episódio aos meus pais. Não sei, nem imagino, o que a menininha possa ter feito para que a professora se enfurecesse daquele jeito. Sei que nasceu aí o meu “medo de professor”... que, felizmente, desfez-se com a passagem do tempo. Depois daquilo, só em 1956, no 1º ano do ginásio, eu conheceria outra professora que agredia os alunos: dona Adelaide, de Matemática. Mas, com dona Adelaide, a agressão não era algo assim meio selvagem, como vi em Dona Maria Antônia, porque parecia ter mais um sentido ou propósito de humilhar o aluno, do que propriamente machucá-lo... se bem que, passados 70 anos desse episódio, não tenho muita certeza do tal propósito, já que eu, particularmente, nunca fui vítima de um livro grande de capa dura ser lascado na minha cabeça pelas mãos da malvada professora.
Estranhamente,
embora me recorde do professor Valdevino, não me lembro da matéria que ele
lecionava. Talvez fosse Geometria. É uma pena, mas não me lembro desse
importante detalhe.
Meu irmão
Olímpio era 9 anos mais velho que eu. Nós chegamos a Ponta Grossa pela segunda
vez em fim de 1955 (a primeira vez ali vivemos de 1948 a 1952). Em algum momento da
nossa primeira estada em Ponta Grossa, ele foi aluno de Armida Frare. Creio que
isso ocorreu no começo do seu curso ginasial. E um dia, por ter errado a tarefa
ou a lição no quadro-negro, ela aplicou-lhe na mão um tabefe com a palmatória, que
consistia num aparelho de madeira com a ponta espalmada e, se não me engano, contendo
alguns furos. Olímpio simplesmente voltou à sua carteira, pegou seu material
escolar e saiu da sala de aula, sob o olhar espantado da professora que o
espancara, para nunca mais voltar ali. Meu pai ficou profundamente irritado com
essa educadora, foi à escola, mas não me recordo como resolveu-se o problema,
pois se meu irmão estivesse entre os 14 ou 15 anos, eu teria a idade de 5 ou 6.
Muitos anos depois desse imbróglio, no fim de 1955, tendo terminado o curso
primário, eu frequentei um curso de três meses de “admissão do ginásio”, para
só então poder entrar no 1° ano do curso ginasial. E a melhor professora da
cidade do “curso de admissão ao ginásio” era... de Dona Armida. Entretanto,
comigo foi diferente. Meu pai preveniu-me: “não admita que ela lhe bata”. Mas a
professora já não usava mais a palmatória, embora tivesse um objeto desses, de
madeira, sobre a sua mesa, como se fosse uma peça decorativa. Talvez fosse
apenas um souvenir da época em que
bater em aluno era uma atitude tolerada pela maciça maioria dos pais. Tudo o
que me lembro é que o curso foi ótimo e eu passei no exame de admissão ao ginásio.
De Dona Armida guardei uma imagem de simpatia e seriedade. Mas devo lembrar que
no ginásio eu enfrentaria durante quatro longos anos outra professora, a de
Matemática, que – como comentei ao início deste meu texto – agredia os alunos
com “croques” e descia os livros de chamada, de capa dura, violentamente na
cabeça dos meninos (durante todos os quatro anos do ginásio, meninos tinham aulas pela manhã e a tarde era das meninas. Não havia no meu colégio turmas mistas). O tempora o mores.
Boníssimo, o professor era como dizia seu nome: o plácido professor Plácido Cardon, de História do Brasil. Lembro-me de sua voz aguda e das aulas alegres e leves. Lembro-me também de Nelson Abilhoa, que era o afável e amigo professor de Desenho, matéria em que eu sempre recebia a nota máxima. É uma pena que eu tenha me esquecido do nome da professora de Música, que nos ensinou a cantar vários hinos. Havia também o professor Othon, de Química (ou seria de Física?).
Um dos meus professores mais marcantes foi Mitinoski – peço desculpas, mas não me recordo de seu nome completo, nem se grafei corretamente o seu sobrenome, e tampouco sou capaz de dizer qual era a sua matéria. Talvez fosse o Inglês. Entretanto, a meu tempo ele foi o único professor “perseguido” pelos alunos. Eu não o agredia mas, inconsequente devido ao desprendimento natural às crianças, ria-me o tempo todo das “investidas” dos meus colegas contra ele, que chegavam a levar “traques” (pequenas “bombinhas”) que espalhavam entre as carteiras, para que o professor passasse estourando-as sem querer na cadência dos seus passos. Ele usava um enorme relógio de bolso, que consultava desconfiadíssimo, pois a cada tentativa de controlar o horário, de algum ponto da sala ouvia-se alguém alertar: “ói o relógio!”... e ele imediatamente escondia aquele enorme marcador de horas, como se sentisse vergonha de exibi-lo. O professor Mitinoski tinha um carro muito antigo, um “calhambeque”, que deixava a uns 100 metros de distância da escola, porém controlava o carro seguidamente olhando pela janela da sala de aula que ficava no 1º andar. Às vezes, após olhar pela janela, ele saía correndo da sala... já sabíamos que alunos mais velhos, de outras turmas, estavam arrastando o seu calhambeque para pô-lo sobre a calçada. Apesar de todas essas agressões, ele, no máximo, expulsava algum aluno da sala de aula, mas jamais agrediu qualquer um dos garotos.
Lembrei-me também de Dra. Olga Thomé, magra e elegante, de Ciências Naturais, que era irmã de Dona Adelaide. Digo que era elegante porque certo dia todos nós notamos que ela chegou à aula com um vestido que não tinha cintura; era reto dos ombros à barra à altura dos joelhos. E já percebemos que ela, inovadora e ousada, estava usando a famosa “moda saco”, que já tínhamos visto nas páginas da revista O Cruzeiro.
Enfim, o
livro do professor Joselfredo Cercal de Oliveira trouxe-me a um turbilhão de
lembranças. Devo acrescentar que o meu caderno de desenho com mapas do Brasil e
do mundo feitos por mim, eu tenho até hoje guardado, com os elogios e o “visto”
do sempre lembrado e querido professor de Geografia.
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D. Adelaide, não sei, mas parecia ter alguma ascendência árabe, terra natal dos algarismos arábicos, ou indo-arábicos e da álgebra. Era muito cruel o modo como tratava os alunos que, por algumas vezes, erravam. Afinal, sempre soube e se consolidou no curso que fiz de Didática do Curso Superior: O erro faz parte da aprendizagem. Mas a pancadaria inibe. Fui diretamente vítima daquela personalidade neurótica. Cascudos, chapuletadas com o livro de chamada, puxões de orelha por meio dos quais nos fazia dar cabeçadas no quadro negro. As orelhas ficavam ardentes e vermelhas, a testa com giz e pequenos galos. Uma tortura. Meu consolo futuro foi conhecer, desta vez na "Academia" o agradável carinho da professora de música, atraente, de belos olhos azuis, lindo corpo e feições angelicais, (não lembro o nome dela). Ficaram inesquecíveis na memória os afagos de seus cabelos longos sobre minha cabeça e ombros quando me explicava, pacientemente, a matéria...
ResponderExcluirCaro Carlos Oswaldo Bevilacqua, é verdade, você também conheceu as "sessões de tortura" da nossa professora de Matemática. Eu não me recordava de você, especificamente, passando por aquelas humilhações, porque elas eram "comuns" a quase todos. Só um detalhe escapava à minha memória, que eram os puxões de orelha que ela dava nas suas vítimas. De repente isso aflorou à minha memória, mas também disso eu escapei ileso. Não sei como driblei TUDO aquilo ao longo dos quatro anos do ginásio. Creio que o que me salvou foi o MEDO de ser agredido por ela, o que me fazia estudar como se fosse um caso de vida ou morte. Mas ao terminar o ginásio, quatro anos suportando assistir às "sessões de tortura", vinguei-me esquecendo de tudo o que aprendi. Hoje sou um zero à esquerda em Matemática, pois esqueci até a raiz quadrada... e sou feliz ao cubo, hahaha...
ResponderExcluirNão fui seu colega na Escola de Aplicação, pois já contava com quase 9 anos de idade e me "encaixei" no 4º ano, após transferência do Pedro Varela do Rio de Janeiro.
ResponderExcluirSim, Bevilacqua, sei que não fomos colegas nos tempos da Escola de Aplicação, quando fui aluno de Dona Maria Antônia em 1951. Lembro-me, isto sim, que fomos colegas na Academia, mas não me lembro em que anos. Nós nos formamos em 1959 (eu já completara 16 anos) conforme nosso convite para a formatura: https://fsoutone.blogspot.com/2019/03/os-graduandos-do-ginasio-ponta.html
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